
Seguem curtas anotações sobre alguns filmes lançados em 2024 (notas dos filmes entre parênteses – escala de 1 a 5):
A Real Pain: Dois primos, com personalidades bem diferentes, reúnem-se para uma viagem pela Polônia em homenagem à sua falecida avó, mas antigas tensões vão ressurgir durante o trajeto. Fracassada tentativa de dramédia (não emociona e nem faz rir) com a pretensão de discutir como deveríamos nos sentir com relação a dor. Devemos colocá-la numa balança? Se a sua dor não está à altura de uma tragédia mundial, ela não é válida? Toda dor é válida de diferentes maneiras? Só mesmo nesta era do vitimismo patológico alguém compararia a experiência de um sobrevivente dos campos de concentração com as agruras emocionais de dois adultos imaturos e superficiais, incluindo um failed fledgling. E por que quase todo filme atualmente apresenta o consumo de maconha como algo saudável e divertido? O filme é dirigido pelo ator Jesse Eisenberg que atua como um dos primos. A direção de Eisenberg reflete sua capacidade de atuar: nula. (1)
A Quiet Place: Day One: Jovem fica presa na cidade de Nova York durante os primeiros momentos de uma invasão por criaturas alienígenas que se orientam através da audição. Caça-níquel de uma franquia que já era ruim. Filme sem qualquer resquício de suspense ou ação, extremamente enfadonho; e com atores protagonistas (Lupita Nyong’o e Joseph Quinn) abaixo da linha da mediocridade, incapazes de dar vida aos momentos de compaixão e sacrifício que o roteiro aparentemente queria transmitir. (1)
Alien: Romulus: Enquanto vasculham as profundezas de uma estação espacial abandonada, um grupo de jovens colonos espaciais se depara com a forma de vida mais aterrorizante do universo. Até quando vão espremer a franquia Alien? Os últimos dois filmes – Prometheus (2012) e Convenant (2017) – foram ruins, mas este Romulus conseguiu ser pior: elenco risível, previsível, cenas (mal) requentadas de filmes anteriores, sem emoção. E que dizer de uma adolescente, sem nenhum treinamento militar, ser capaz de aniquilar um pelotão do antes temível alienígena? Um desastre. (1)
All We Imagine as Light: O drama explora a vida de três mulheres trabalhadoras em um hospital de Mumbai que migraram da área rural para avançar em suas carreiras. O filme atende à receita para reconhecimento da crítica e prêmios em festivais: versa sobre mulheres vencendo dificuldade, afronta as tradições, reprova a iniciativa privada, é uma produção não norte-americana ou europeia, e é escrito e dirigido por uma mulher (Payal Kapadia neste caso). E deu certo, arrebatou o Grand Prix em Cannes e frequenta todas as listas de melhores filmes do ano dos críticos. Mas o filme não empolga. As personagens (estereotipadas) não geram empatia, a narrativa se arrasta, o trabalho de câmera é ordinário, e o desenlace principal extrapola o ridículo. (1)
Anora: Prostituta do Brooklyn conhece e se casa impulsivamente com o filho de um oligarca russo, mas seu conto de fadas é ameaçado quando os pais do jovem partem para Nova York para anular o casamento. Dramédia promíscua do diretor Sean Baker, o mesmo realizador do abominável The Florida Project (2017) que vive confundindo a aprovação de tabus com rebelião. A primeira metade do filme é só sexo, nudez e consumo de drogas, e na segunda parte as personagens disputam quem profere mais obscenidades. Ao final a “brilhante” puta começa a desconfiar que seu estilo de vida não é grande coisa. O Festival de Cannes, campeão na promoção da destruição civilizacional, concedeu a Palma de Ouro ao filme. (1)
Beetlejuice Beetlejuice: Após uma tragédia familiar, três gerações da família Deetz voltam para sua velha casa ainda assombrada por Beetlejuice. Mais um caça-níquel sem vestígio de originalidade criativa, apenas um confusa mistura de enredos. O diretor Tim Burton conseguiu fazer uma comédia sem nenhum momento minimamente engraçado. Constrangedor. (1)
Civil War: Num futuro distópico, quatro jornalistas viajam pelos Estados Unidos durante um conflito nacional com a intenção de chegar à Casa Branca para entrevistar o presidente antes que ele seja deposto. Filme antiguerra monótono, com personagens nada empáticas, e com (as poucas) cenas de ação de um irrealismo cômico – uma vazia meditação sobre jornalismo e divisão política. O diretor tenta não tomar partido político mas não consegue, e, como a maioria de seus colegas hollywoodianos, apresenta pessoas preocupadas com a imigração em massa como xenófobos genocidas cruéis, e indivíduos preocupados com o excessivo poder do Deep State como tiranos. (1)
Conclave: O filme apresenta um dos eventos mais secretos e antigos do mundo – a seleção do novo Papa – em meio a conspirações, ambições e uma batalha política. Baseado no romance homônimo de Robert Harris publicado em 2016. Conclave poderia ter se desviado do romance e ser um alerta sobre a infiltração progressista na Igreja, mas é somente mais uma produção woke, antibíblica e idiota que promove o relativismo moral e teológico – a personagem principal (interpretada por Ralph Fiennes) claramente expressa uma definição falsa e antibíblica da fé. A narrativa ainda zomba deliberadamente do líder da facção conservadora, num claro exemplo de calúnia artística, e promove a agenda de gênero com a ignóbil figura do cardeal hermafrodita. (1)
Cunk on Life: A divertida personagem Philomena Cunk (interpretada por Diane Morgan) volta para investigar questões profundas da vida, examinando assuntos do Big Bang à IA, através de suas hilárias entrevistas com acadêmicos. Típico humor inglês com jogo de palavras, duplo sentido, trocadilhos, e sarcasmo empregado com aquela inconfundível semblante impassível.O resultado não é tão divertido quanto as séries televisivas Cunk on Earth (2022) e Cunk on Britain (2016), mas ainda funciona. (3)
Ferrari: Ambientado no verão de 1957, com a empresa automobilística de Enzo Ferrari em crise, o ex-piloto que se tornou empresário leva seus pilotos ao limite para vencer a corrida Mille Miglia. Drama enfadonho dando demasiada atenção as agruras do adultério de Enzo Ferrari, e mesmo assim acabamos o filme sem uma noção de quem é ele ou do que o motiva além de seu desejo de sucesso. O filme é baseado no livro Enzo Ferrari: The Man, The Cars, The Races, The Machine escrito por Brock Yates, pena que o diretor Michael Mann deixou em segundo plano os carros, as corridas e a máquina. E para complicar ainda escalou o péssimo Adam Drive no papel principal. (2)
Furiosa: A Mad Max Saga: Origem da guerreira renegada Furiosa (interpretada pela esquelética Anya Taylor-Joy, a atriz de uma cara só) antes de seu encontro e parceria com Mad Max. Nada de novo neste quinto capítulo da saga esgotada desde o seu segundo filme de 1981. Apenas uma enxurrada de efeitos especiais, feminismo a rodo, e uma pitada de culto a Gaia com o patético "the stars be with you". O diretor australiano George Miller com seu Mad Max repete seu xará George A. Romero e seus zumbis: realizaram um filme interessante no início da carreira, e depois viveram de trucidar o mesmo com infindáveis sequencias. (2)
Gladiator II: Depois que seu lar é conquistado e sua esposa morta, um guerreiro escravizado torna-se gladiador por uma chance de ir a Roma para vingar-se. O diretor Ridley Scott continua sua sanha em destruir sua obra, depois de estraçalhar Alien (1979) com ridículas continuações, agora foi a vez de enxovalhar Gladiator (2000) – absolutamente nada funciona nesta continuação. O roteiro não passa de uma recauchutagem piorada do original, os efeitos especiais fazem o filme parecer uma animação, as personagens são caricatas e mal desenvolvidas, e os atores péssimos (Paul Mescal e Pedro Pascal não sabem atuar, Denzel Washington parece constrangido e Connie Nielsen perdeu a expressão facial de tanto botox). Um desastre. (1)
Here: Sobre múltiplas famílias que habitam um mesmo espaço ao longo do tempo, através de gerações, capturando suas experiências. Baseado no romance gráfico homônimo de Richard McGuire publicado em 2014. O diretor Robert Zemeckis reúne novamente boa porte do elenco de Forrest Gump (1994), mas não consegue repetir a atratividade deste. Deram demasiada atenção ao formado e efeitos especiais que esqueceram de desenvolver uma história minimamente envolvente. E ainda despejam lacrações feministas e raciais em profusão – e até enfiaram as porcarias das máscaras do embuste do último vírus chinês. De positivo apenas os avanços na tecnologia de rejuvenescimento. (2)
Juror #2: Jurado em um julgamento de assassinato enfrenta um sério dilema moral, que poderia ser usado para potencialmente condenar ou libertar o réu. Correto drama de tribunal do diretor Clint Eastwood. Um instigante estudo ético que desafia a audiência a considerar se faria a coisa certa, mesmo que isso arruinasse suas vidas. (3)
Longlegs: Na perseguição de um serial killer, uma agente do FBI segue uma série de pistas ocultas que a levam para onde ela menos espera. Fantasia satânica desprovida de suspense e interesse, com Nicolas Cage fazendo uma caricatura de passadas atuações, uma protagonista que nunca consegue estabelecer a personagem, e os, agora usuais, ridículos atores coadjuvantes étnicos. (1)
Megalopolis: Fábula ambientada em um imaginado EUA, onde a cidade de Nova Roma vê o conflito entre um artista que busca saltar para um futuro utópico e idealista, e o prefeito comprometido com uma política regressiva. Pretensioso, o diretor Francis Ford Coppola diz que este seu último filme traria "esperança para o mundo". Mas entregou uma massa fecal misturando filosofia de botequim, politicagem rasteira, efeitos especiais risíveis, e uma cambada de atores ruins passando vergonha. Coppola parou de fazer filmes decentes em 1979, desde então só produziu fracassos, culminando com esta aberração – está se aposentando com quatro décadas de atraso. (1)
Music by John Williams: Documentário sobre o lendário compositor John Williams, com destaque às suas inesquecíveis trilhas sonoras. Mais que merecido tributo que nos deixa ansiosos para revisitar seus temas mais famosos e conhecer um pouco mais sobre suas criações. (4)
Nosferatu: Um conto gótico de obsessão entre uma jovem assombrada e o aterrorizante vampiro apaixonado por ela, causando um horror indescritível em seu rastro. Mais uma adaptação cinematográfica do romance de Bram Stoke seguindo as trilhas das versões de F.W. Murnau e Werner Herzog. Não há nada de errado de recontar histórias conhecidas, podendo-se dar ênfase a diferentes aspectos da obra e/ou lhe trazer novas perspectivas. Porém as inovações do diretor Robert Egger saíram pela culatra. Ele não faz bom uso do potencial dos atuais efeitos especiais – apresenta um Nosferatu que mais parece uma animação entre seres reais –, a introdução de erotismo explícito é gratuita e de mau gosto, e esvaziou do enredo o sacrifício por amor em troca de uma mal contada ligação passada da Ellen com o vampiro. E para concluir o desastre escala uma atriz particularmente feia, de traços simiescos, para fazer o papel da supostamente delicada e estonteante Ellen. Ao menos a crítica original de Bram Stroke ao cientificismo, encarnada na personagem Prof. Eberhart von Franz (Van Helsing no livro), foi mantida. (1)
Nr. 24: O jovem norueguês Gunnar Sønsteby decide resistir à invasão alemã durante e II Grande Guerra, vindo a tornar-se um dos líderes da resistência. Autor de inúmeros ousados atos de sabotagem, Sønsteby tornou-se o maior herói de guerra da Noruega. O diretor norueguês John Andreas Andersen faz uma justa homenagem a um herói nacional, cujos feitos podem ser lidos com mais detalhes no livro Report From Nr. 24 (1999) de autoria de Sønsteby. Duas cenas na palestra do velho Sønsteby a jovens noruegueses valem o filme. Na primeira ele indaga a audiência se eles se sentem seguros, e diante da resposta afirmativa ele diz “Eu também me sentia seguro (antes da guerra). Meus amigos também se sentiam seguros. Até que não mais.” E na segunda, ao ser perguntado por uma jovem da audiência se, dada a retaliação nazista, valera a pena matar informantes e traidores noruegueses, Sønsteby alega a impossibilidade de responder àquela pergunta e indaga a jovem “Qual o valor da liberdade?” Temo que o não entendimento da profundidade destas duas cenas causarão muitos sofrimentos às futuras gerações. (4)
Rumours: Sátira canadense da cúpula anual do G7, onde os sete líderes tentam redigir uma declaração provisória sobre uma crise global. Desperdício de um tema perfeito para ironizar, e de um par de bons atores. Sem graça e sem sentido. (1)
September 5: Durante os Jogos Olímpicos de 1972 em Munique, Alemanha, a equipe de transmissão esportiva da ABC teve que se adaptar à cobertura ao vivo dos atletas israelenses sendo mantidos reféns pelos terroristas muçulmanos do Setembro Negro. Releitura interessante das 22 horas de cobertura daquele nefasto evento, oferecendo uma análise aprofundada dos esforços da redação em cobrir os acontecimentos, suas decisões, por vezes, com as consequências negativas, e os diferentes sentimentos que o ocorrido provocava na equipe da redação. (3)
The Girl with the Needle: Na Copenhague de 1919 uma jovem operária se vê desempregada e grávida. Ela começa a trabalhar com Dagmar, administradora de uma agência de adoção ilegal, mas seu mundo desmorona quando ela descobre a verdade por trás de seu trabalho. Produção dinamarquesa dirigida pelo sueco Magnus von Horn. A correta fotografia em P&B e alguns interessantes trabalhos de câmera não salvam a grotesca narrativa que confunde suscitar horror com provocar repugnância. O filme baseia-se nos reais crimes da seria killer Dagmar Overbye (1887-1929), mas o diretor preferiu destilar feminismo e miséria humana através da fictícia protagonista. E o que aconteceu com a atenção ao physique du rôle? Como colocam uma atriz fisicamente medonha (e cenicamente medíocre) para interpretar uma beldade que encanta o dono da fábrica? Esta mesma falta de critério na adequação física da atriz à personagem também é observada na protagonista de Anora (2024). (1)
The New Year That Never Came: À beira da revolução, em 1989 na Romênia, seis vidas se cruzam em meio a protestos e lutas pessoais, levando à queda de Ceausescu e do regime socialista. Tragicomédia que fantasia o estopim da revolução durante o discurso de Ceausescu sobre os eventos em Timișoara nos dias anteriores. O povo esgotado de anos de socialismo finalmente tomava coragem e acaba com aquela tirania. Terão os brasileiros a mesma hombridade para derrubar o estamento burocrático que os esmaga há mais de um século? As mais de duas horas de duração do filme apresentam-se um tanto exageradas, mas os últimos 20 minutos ao som do Bolero de Ravel recompensam o esforço. (3)
The Order: Em 1983 uma série de assaltos a bancos e roubos de carros-fortes assustou comunidades no noroeste do Pacífico. Um agente do FBI acredita que os crimes não foram obra de criminosos com motivação financeira, mas sim de um grupo de perigosos terroristas domésticos. Baseado em fatos concretos. Thriller mediano que peca na má intenção de enfiar num mesmo saco a justa (e necessária) revolta contra a hipertrofia do poder governamental com terrorismo, racismo, antissemitismo, xenofobia, e até religião e a instituição familiar. (2)
The Seed of the Sacred Fig: Um juiz investigador luta contra a paranoia em meio à agitação política em Teerã causada pela morte de uma jovem. Produção iraniana dirigida por Mohammad Rasoulof que aborda os protestos pela morte de Mahsa Amini em 2022. O filme começa muito bem apresentando a opressão da teocracia islâmica e, principalmente, em como as pessoas justificam a si mesmas a participação em tal regime, de como administram seu sentimento de culpa até ocultá-lo de si mesmos – uma análise que serve tanto para o letal terror islâmico quanto para o escárnio com o qual o estamento burocrático e seus capangas abusam do povo no Brasil. Porém, a partir da desaparição da arma a narrativa perde coerência e credibilidade, sobrando apenas a justificável denúncia da opressão islâmica, conspurcada com desnecessários apelos feministas. (2)
The Substance: Celebridade em declínio toma uma substância replicadora de células que cria temporariamente uma versão melhor e mais jovem de si mesma. Fantasia misto de sci-fi e body horror que tenta ser uma sátira feminista sobre a fixação da sociedade na juventude, fama e beleza física, mas falha miseravelmente – um filme de mau gosto, mal-executado, totalmente repulsivo, e sem qualquer valor de entretenimento. É o segundo longa-metragem escrito e dirigido por Coralie Fargeat, sendo que seu filme anterior também só exibia baldes de sangue entre devaneios feministas. É só isso que ela sabe fazer: enredos tolos, sem diálogos plausíveis, ideologia bundalelê, e muita violência (nenhuma habilidade necessária). Um filme para esquecer, melhor passar o tempo lendo O Retrato de Dorian Gray (1890) de Oscar Wilde. (1)
Trap: Pai e sua filha adolescente assistem a um show pop e acabam no centro de um evento funesto. A espiral decadente do diretor M. Night Shyamalan parece não ter fim. O filme até que começa com uma premissa interessante, mas descamba para o inverosímil e o ridículo muito rápido. Trap acaba não passando de uma tentativa de showcase para Saleka Shyamalan, a inepta filha do diretor. (2)
Unfrosted: Em 1963, Michigan, as empresas rivais Kellogg's e Post competem para criar um bolo que poderia mudar o café da manhã para sempre. Jerry Seinfeld escreve, dirige e atua neste seu primeiro trabalho para o cinema. Diversão leve principalmente para quem viveu os anos 1960. (3)
We Live in Time: Uma chef promissora e um recém-divorciado têm suas vidas mudadas para sempre quando um encontro casual os une em um romance que dura uma década. Esqueça os filmes em que um pai obcecado pelo trabalho enfrenta uma tragédia na vida e aprende o valor da família. We Live in Time inverte isto apresentando uma mãe obcecada pelo trabalho com poucos meses de vida decide gastá-los aprendendo a cozinhar polvo. E somos convidados a acreditar que esta é a escolha certa quando ela faz um discurso sobre como deseja que sua filha tenha algo pelo qual se lembrar dela. Talvez a melhor maneira de conseguir isso seria passar as poucas semanas restantes na terra com ela. O título do filme deveria ser We Live in Strange Times. (1)