Personagens Principais Odisseu (Ulisses para os romanos) – rei de Ítaca Penélope – esposa de Odisseu Telêmaco – filho de Odisseu e Penélope Atenas – deusa da sabedoria e guerra
Personagens Secundárias Laerte – pai de Odisseu Posido – deus do mar Éolo – filho mortal de Posido incumbido de cuidar dos ventos Nausícaa – princesa feácia, filha de Alcínoo e Arete Circe – feiticeira Calipso – ninfa filha de Atlas Antínoo – líder dos pretendentes de Penélope Argos – cão de Odisseu Mentor – amigo de Odisseu, Atena assume suas feições para guiar Telêmaco
Interpretação O astuto Odisseu apresenta o maior pecado que um grego poderia cometer: a hybris ou soberba. O episódio no qual ele se vangloria diante do Ciclope é emblemático disto. A viagem de retorno a Ítaca é um processo iniciático no qual ele vai purgar esta soberba e ficar mais sábio. Não é por acaso que Atenas, deusa da sabedoria, será sua guia nesta jornada. Ao longo de muitos infortúnios Odisseu vai tornando-se menos arrogante, menos astuto, até encontrar Nausícaa, modelo de pureza espiritual, e perceber o contraste com sua existência decadente. Essa tomada de consciência purga sua soberba (ele se humilha com as cinzas diante dos pais de Naúsicaa – a mãe chama-se Arete (virtude humana)) e Odisseu está apto para retornar à Ítaca – o disfarce de mendigo demonstra sua vitória sobre a hybris.
A descida ao Hades faz parte da viagem iniciática de Odisseu para tornar-se mais sábio, em controle de suas emoções. A noção de descida aos infernos (como Dante Alighieri na Divina Comédia e Cristo na Bíblia) é recorrente nos processos iniciático visando alcançar um patamar mais elevado.
Sabedoria e temperança como grandes virtudes. Ao chegar a Ítaca, Odisseu demonstra um controle de suas emoções que antes não apresentava.
Gnothi sauton = Conheça a si mesmo (sabedoria) Meden agan = Nada em excesso (temperança)
A sabedoria como conceito fundamental para o exercício da vida conceituada por Homero antecede a ciência filosófica em mais de cinco séculos.
A situação de desordem hierárquica, econômica e moral observada em Ítaca durante a ausência de Odisseu representa a desordem provocada pela ausência do Rei, do Pai, do Espírito, e este é o significado simbólico de seu retorno. É a volta do Espírito a sua posição hierárquica que permite a recuperação da ordem. Penélope representa a Terra , o componente amoroso, e demonstra a característica ontológica fundamental da fidelidade da Terra com o Espírito. Somos filhos do Espírito e da mãe Terra, em outras palavras, somos ao mesmo tempo feitos à semelhança de Deus e vindos do pó, essa é a estrutura ontológica da realidade humana estabelecida. A delapidação da estrutura da realidade é recuperada com o retorno de Odisseu e a retomada do casamento da Terra com o Céu, sem o qual impera a desordem.
Se na Ilíada o sentido da história é dizer que os seres humanos são influenciados e conduzidos por forças que eles não controlam – você é responsável pelos seus atos, mas você não é responsável pelo seu Destino –, na Odisseia Homero nos diz que mesmo assim ainda é possível levar uma vida bem sucedida se formos sábios e pios. Assim ambos complementam-se em sua função didática aos gregos. E, junto com a Bíblia, estabelecem as bases da civilização ocidental.
Xenia também é um conceito chave na Odisseia. Abrange os protocolos da relação entre anfitrião e hóspede. Temos ao longo do épico bons (Telêmaco recebido por Nestor e Menelau) e maus (os pretendentes em Ítaca) exemplos de xenia. A desordem em Ítaca é também a desordem em xenia. Entre os vários ensinamentos deste épico destacam-se, além da importância da sabedoria, temperança e xenia, a utilidade da retórica e a relevância do casamento e da fidelidade.
Notas
A Ilíada e a Odisseia são atribuídas a Homero (aproximadamente séculos IX ou VIII a.C.) que teria nascido em Jônia (atualmente Turquia – sete cidades disputam o local do seu nascimento).
São os primeiros textos da tradição literária europeia. Primeiros épicos, que para o grego definia um longo poema na forma rítmica do hexâmetro datílico.
Ambas as obras homéricas foram adotadas como ferramentas educacionais nas cidades gregas: proviam exemplos de comportamento e estabeleciam o quadro de referência oral.
Troia foi saqueada em 1184 a.C., e a Ilíada e a Odisseia foram copiladas provavelmente entre 850 a.C. e 750 a.C. (o alfabeto fenício foi adotado nas cidade gregas por volta de 900 a.C.). Ambas nasceram de tradição oral.
Eventos pós-Ilíada foram narrados em uma série de épicos menores dos quais apenas fragmentos chegaram até nós. Fazem parte do Ciclo Épico: Aethiosis, Little Iliad, Ilioupersis e Nostoi. (ver The Epic Cycle de M. L. West).
in media res = no meio das coisas. Os épicos começam assim, pois se assume que o contexto da história é conhecido dos ouvintes ou leitores.
Odisseia é a fonte da Comédia (no sentido de que as coisas concluem-se positivamente).
O nome Odisseu significa “aquele que provoca e sofre dor”.
Odisseu cativo de Calipso (“aquela que esconde”) não é ele mesmo. Ele ambiciona retornar para Ítaca onde pode realizar-se. Ele também entende sua humanidade, recusa a proposta de imortalidade feita por Calipso.
A deusa Atenas aparece como Mentor, amigo de Odisseu, para guiar Telêmaco. Daí a palavra mentor para uma pessoa mais velha que orienta uma mais jovem.
O assassinado de Agamémnone por Clitemnestra e Egisto funciona como um paralelo ao que poderia acontecer com Odisseu em seu retorno a Ítaca.
Telemaquia = a história de Telêmaco descrita nos livros I ao IV. Auxiliado por Atenas o jovem vai tornar-se um adulto com todas suas potencialidades.
Sequência cronológica dos livros: IX-XII, V-VIII, XIII-XXIV sendo que a Telemaquia transcorre em paralelo a V-VIII.