“Os erros na vida prática decorrem dessa modalidade de ignorância, que consiste na presunção de sabermos o que não sabemos.”
– Sócrates (117d)
Personagens
Sócrates – filósofo
Alcibíades – jovem, futuro político e estratego ateniense
Através de sua maiêutica, Sócrates desmonta a arrogância de Alcibíades ao levá-lo a conclusão de estar despreparado para a função de estadista a que se propunha. Sócrates demostra ao jovem que este precisa, antes de tudo, identificar aquilo que realmente sabe (com certeza) e reconhecer o seu oceano de ignorância – “só sei que nada sei”, a humildade diante do saber dos deuses, esta é a sabedoria de Sócrates (anti-húbris, um ato de humildade).
O primeiro passo para buscar conhecer algo é a consciência de que não conhecemos – o falso saber como principal fonte dos problemas e erros técnicos, i.e. os males sociais da vida prática resultam da ignorância: aquele que sabe faz bem feito, o que sabe que não sabe não arrisca em fazer, e apenas o que pensa que sabe fará errado. A consciência da própria ignorância cria a base sólida sobre a qual crescer e alcançar o próximo patamar de certeza.
A tensão entre o coletivo e o individual é exposta na discussão sobre a natureza da ação política, instigando a noção de que o verdadeiro estadista alivia tal tensão buscando a harmonia dos opostos.
Mas como conhecer os demais? E assim trabalhar por esta harmonia? O primeiro passo é conhecer a si mesmo, e o homem é sua alma (superior ao corpo e aos bens materiais). E a melhor forma de conhecer nossa alma é através do seu reflexo nas almas dos demais, naquilo que ela tem de mais essencial: o conhecimento, a porção mais divina da alma (analogia do reflexo de nossa imagem na retina alheia) – a comunhão de almas como caminho para a harmonia social.
Esta busca de autoconhecimento e enriquecimento da alma é melhor conduzida quando possuímos areté (desempenhar da melhor forma possível aquilo que é peculiar ao homem). Os jovens, que naturalmente ainda não possuem areté, devem apoiar-se nos sábios que já a possuem.
Notas
Platão (427-348 a.C.) nasceu em Atenas ou na próxima Egina.
Filho de Ariston, descendente do rei Codro, Perictíone e de um irmão de Sólon do lado materno. Ainda na juventude, recebe o apelido de Platão (“largo”) por razões incertas, mas provavelmente ligadas ao seu tipo físico. Seu nome era Arístocles.
Aos 19 anos torna-se discípulo de Sócrates. Sua obra escrita nos chegou aparentemente completa (26 diálogos são considerados legítimos).
Segundo o matemático e filósofo Alfred North Whitehead (1861-1947), “A mais segura caracterização da tradição filosófica europeia é que esta se constitui de uma série de notas de rodapé a Platão.”
Os subtítulo dos diálogos, e.g. Fedro, sobre o Belo, foram dados por Trasilo no século I, na Biblioteca de Alexandria que então comandava.
O Primeiro Alcibíades, sobre a natureza do homem, é diálogo duvidoso (gênero maiêutico), provavelmente do período inicial de diálogos socráticos.
A vida de Alcibíades (450-404 a.C.) como estratega e político brilhante mas inescrupuloso é retratada em Vidas Paralelas de Plutarco. Ele também é destacado em História da Guerra do Peloponeso de Tucídides.
O encontro entre Sócrates e Alcibíades teria ocorrido em 433 a.C., pouco antes da participação de ambos na batalha de Potidea. E, com base no anacronismo da descrição de Esparta, estima-se que o diálogo tenha sido escrito antes de 371 a.C. (data do colapso de Esparta em Leuctra).
Sócrates inicia o processo maiêutico questionando Alcibíades do porquê ele querer ser o que deseja ser (conselheiro dos atenienses) – o imperativo realmente de entender o porquê de nossas próprias ações.
Para o platonista Paul Friedländer (1882-1968) a alegoria do reflexo na pupila é prova de legitimidade da autoria do diálogo.
O argumento dos poemas homéricos Ilíada e Odisseia é citado por Sócrates como o desacordo de sentimento entre o justo e o injusto.