“Grande és tu, Senhor. (…) fizeste-nos para ti, e inquieto está nosso coração, enquanto não repousa em ti.” – Santo Agostinho, oração de abertura de Confissões
Phil Connors (Bill Murray) é um egocêntrico com ilusão de grandeza, sua autoindulgência e auto-deificação espelham o galopante narcisismo de nossa sociedade cuja crença no direito a auto-realização é acompanhado da histérica revolta aos naturais obstáculos impostos pelo destino.
Preso na eterna repetição do mesmo dia, Phil passa por sucessivas fases, (a) primeiro quase enlouquece, depois percebe que pode viver sem sofrer consequências por seus atos e (b) entrega-se na busca de prazeres carnais, mas esta autogratificação resulta em nada, e, após inutilmente (c) apelar ao suicídio, Phil (d) convence-se de ser um deus, mas a inevitável morte do mendigo logo o destitui de tal crença.
Assim nosso herói percorre os extremos das paixões: da banalização dionisíaca (Tifeu) à exaltação desarmônica dos desejos evolutivos de perfeição (Équidna), para descobrir que este caminho não traz significado e propósito (telos) a nossas vidas. Ele conscientiza-se que precisamos de um significado e propósito fora de nós mesmos (ver Em Busca de Sentido de Viktor Frankl), que o homem anseia pela beleza que nos desperte do sono narcisista, e que nosso coração aspira por uma vida de encanto e deslumbramento – o homem precisa da verdade, da bondade e da beleza para realizar-se espiritualmente.
E Phil vai buscar sentido na música (aprende a tocar piano) e nas artes (torna-se destro na escultura em gelo), pois elas transformam o tempo e o espaço; volta-se para a grande literatura para despertar sua imaginação moral – “lemos a Ilíada porque a vida é uma batalha, a Odisseia porque a vida é uma jornada, e o Livro de Jó porque a vida é um enigma” (G. K. Chesterton). Phil, finalmente, começa a ver as necessidades dos outros como mais importantes que a sua própria – descobre que é apenas quando perdemos nossa vida é que começamos a encontrá-la.
Seu desejo por Rita (Andie MacDowell) transforma-se em verdadeiro amor (sem reservas ou esperança de correspondência) – sua humanidade foi finalmente despertada, Rita apaixona-se por ele, e o feitiço do tempo é quebrado (ontologicamente a mulher salva o homem aproximando-o de Deus).
Grande filme sobre o que nos faz verdadeiramente humanos.
Filme Nota 5 (escala de 1 a 5)