Personagens Principais Fausto – acadêmico angustiado, 60 anos Mefistófeles – diabo que negocia a alma de Fausto Margarida (Gretchen) – jovem virginal
Personagens Secundárias Wagner – assistente de Fausto Marta Schwerdtlein – vizinha de Margarida (ativa, remete a irmã de Maria na Bíblia) Valentim – irmão de Margarida Ariel – espírito benéfico que reanima Fausto Imperador – provavelmente inspirado em Maximiliano (Sacro Império Romano 1493-1519) Nicodemo – acaipirado candidato a estudante e depois orgulhoso bacharel Homúnculo – homem artificial gerado por Wagner Helena – a bela da guerra de Troia resgatada do Hades Mata-Sete, Pega-Já e Tem-Quem-Tem – os valentes camaradas convocados por Mefistófeles Filémon e Baucis – casal habitante do mangue (na mitologia hospedaram Zeus e Hermes)
Interpretação Fausto nos é apresentado como um acadêmico fracassado, desesperançado com a limitada capacidade humana de entender o mundo (pequenos mistérios). É o ser prometeico frustrado (homem moderno) em sua ilusão de querer ser deus, e que no Fausto II vai ironizar seus antigos pares representados por Wagner em sua tentativa de recriar o homem – fruto da impossibilidade de abarcar o todo dentro dos limites do mundo cósmico dos pequenos mistérios. Fausto já abandonara tal pretensão e caiu numa espécie de vazio espiritual, sentindo que não desfrutou a vida (angústia fáustica (faustischer Drang – ter enormes pretensões na vida e cair no vazio existencial ao não satisfaze-las), e deseja morrer. É a tragédia da infelicidade humana. Qual seria então o caminho para o homem?
A partir daí Goethe nos vai compartir sua visão do mundo, de inspiração kantiana, da primazia da ação: “Erra o homem enquanto algo aspira” (Es irrt der Mensch. Solang’er strebt.) coloca Goethe na boca de Deus. Fausto, num embate com Mefistófeles, vai agir em diferentes situações até sua redenção final. Apesar de suas ações não serem necessariamente mal intencionadas, Fausto vai proporcionar uma série de desastres (“erra enquanto aspira”). Este mal criado é justificado logo no início de Fausto I quando Mefistófeles se apresenta: “Sou parte da Energia, que sempre o Mal pretende e o Bem sempre cria”, lembrando a nociva dialética hegeliana que entende a estrutura da realidade como uma eterna confrontação e transmutação. Este tipo de pensamento vai inspirar a busca de uma existência titânica superior aos códigos de conduta e a moralidade - übermensch nietzchiano – e empurrarão os alemães alegremente para o desastre da Primeira Grande Guerra.
Posto isso é difícil justificar a redenção de Fausto no final. De fato uns veem uma ascensão ao céu pagão grego (Otto Maria Carpeaux), ou ascensão nenhuma, ou apenas um triunfo da imanência spinozista de Goethe (José Guilherme Merquior). Já outros entendem que Goethe quer nos dizer que a capacidade de ação e reação (não ter inércia por medo da imperfeição), o princípio ativo (eterno masculino), não é suficiente para a redenção, sendo necessário combiná-lo com a humildade do princípio passivo, amoroso, o eterno feminino, para a salvação (só se entende Deus com a passividade feminina – contemplação humilde dos grandes mistérios).
Hegel, com sua dialética do negativo, dará uma suntuosa veste teórica a essa idéia. O homem deve pecar, deve sair da inocência natural para se tornar Deus. Ele deve realizar a promessa da Serpente: deve conhecer, como Deus, o bem e o mal. Esse conhecimento “é a origem da doença, mas também a fonte da saúde, é o cálice envenenado no qual o homem bebe a morte e a putrefação, e, ao mesmo tempo, o ponto em que nasce a reconciliação, uma vez que pôr-se como mau é em si a superação do mal”.
Notas
Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) nasceu em Frankfurt-am-Main (então uma cidade-estado de aspecto medieval – hoje Alemanha). O maior literato alemão, especialmente em função de sua poesia (que se perde na tradução). Outros creditam a Friedrich Schiller o título de maior poeta da língua alemã (autor da peça Guilherme Tell de 1804).
Fausto I é publicado em 1808, e a segunda parte em 1833 (póstumo). Em 1775 leu para amigo o manuscrito de Fausto (Urfaust) que em muito se assemelha a Fausto I.
Outras obras destacadas de Goethe são: Os Sofrimentos do Jovem Werther (1774) e Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister (1829).
Participa do movimento Sturm und Drang (1770-1790 – rebelião de jovenzinhos burgueses segundo Otto Maria Carpeaux) caracterizado pela expressão de sentimentos com toda a força e potência, quase sem medir consequências – sair da moderação greco-romana e ir para o mundo de expressionismo sentimental (obra literária como exposição da intimidade).
Georg Johann Faust (1480-1540) nascido em Knittlingen, sudoeste da atual Alemanha, foi um astrólogo, vidente, quiromante, ocultista e alquímico. Em 1587 o pastor protestante publica o Livro Popular relatando a história do Dr. Fausto e da negociação de sua alma.
Mefistófeles é o diabo especializado em comprar a alma alheia.
Na primeira parte da obra Fausto viaja pelo “pequeno mundo” da vida privada e do amo. Na segunda parte, ele penetra no “grande mundo” da civilização e da cultura. – fusão do classicismo (cultura grega – Helena) com o romantismo (cultura germânica – Fausto), empreendimentos econômicos e conquista da natureza.
Es irrt der Mensch, solang'er strebt – o homem erra enquanto tenta – é uma das linhas bases do goethismo, uma cosmovisão criada pelo autor, um modelo de compreensão do mundo.
A maior inspiração de Nietzsche está no Fausto (Übermensch).
Gênio da Ação – convocado por Fausto – sugestão de “erra enquanto tenta”, significado da palavra ação.
Lilith da noite de Valpúrgis: teria sido a primeira mulher de Adão que recusou submeter-se ao homem (padroeira do feminismo). Teria então transformando-se em bruxa e abjurado a criação – entidade demoníaca.
Fausto está em dúvida entre o Céu representado por Margarida e a Terra de Mefistófeles.
Outras relevantes obras fáusticas: O Retrato de Dorian Gray (1890) de Oscar Wilde, Mephisto (1936) de Klaus Mann, Douktor Fausto (1947) de Thomas Mann, Grandes Sertões Veredas (1956) de Guimarães Rosa, e O Mestre e a Margarida (1966 - póstumo) de Mikhail Bulgakov.