Personagens Principais Héracles – maior herói grego, filho de Anfitrião e Alcmena, Zeus é seu pai mítico Zeus – deus olímpico, qualidade suprema, espírito do homem e seu poder fecundante Hera – deusa olímpica, regente do amor sublime Atenas – deusa olímpica, regente da sabedoria
Personagens Secundárias Euristeu – coroando no lugar de Héracles Mégara – primeira esposa de Héracles Ônfale – amante que ridiculariza o herói Dejanira – virgem pela qual Hércules se apaixona
Interpretação Os deuses gregos correspondem às idealizações das qualidades humanas. Assim, filho mítico de Zeus, Héracles tem todas as potências para ser o grande rei da Grécia, e está predestinado a ser vencedor no plano essencial. Sua força excepcional é símbolo da excepcional intensidade de seu impulso evolutivo espiritual. Mas ele é privado do amor sublime que o ciúme de Hera lhe nega. Ele sempre será rebelde à união de almas, única capaz de sublimar a impetuosidade do desejo sexual. Héracles tem a força do espírito, mas falta-lhe o equilíbrio da alma.
Ainda no berço mata duas serpentes (símbolo perversão espiritual) demonstrando que a resistência à vaidade é inata. Amamentado por Atenas, bebe tão avidamente que o leite jorra para formar a Via Láctea (estrelas simbolizam a vida sublime).
Uma intriga de Hera tira-lhe o trono que é concedido a Euristeu (representante do reino convencional). O reino de Héracles não será deste mundo, mas sim no plano existencial. Sua luta não será por um reino, mas sim existencial contra a banalidade dionisíaca, contra sua própria fraqueza como lhe diz o oráculo de Apolo. Para mostrar que as tendências dominadoras não representam um perigo, o guerreiro do espírito será representado com: (a) a pele do leão, signo da vitória sobre a dominação perversa, (b) o arco apolíneo que lança flechas / raios solares, e (c) a clava que, na mão do herói-purificador, significa o esmagamento das tendências dominadoras.
A vida devassa de Héracles é representada particularmente por sua atitude com três mulheres: Mégara, Ônfale e Dejanira.
Ainda adolescente casa-se com Mégara. Em um acesso de loucura enviado por Hera (impossibilidade de união de almas torna qualquer vínculo como obrigação insuportável) mata seus filhos. Os doze trabalhos serão uma expiação para este crime, a batalha anímica contra a perversão dionisíaca.
Os 12 Trabalhos
Leão de Neméia – reforça seu domínio sobre as tentações de dominação social. Vestir a pele do leão, ter a força, mas também a postura do leão (sufocar o leão em si).
Hidra de Lerna – as cabeças remetem a multiplicidade de vícios (neste caso banais pois a hidra vive no pântano). Uso da espada (símbolo da combatividade espiritual) e da chama que, como a água, simboliza purificação sublime. Uma permanece enterrada – “O exercício da virtude é a constante vigilância dos seus vícios” (Sócrates).
Aves de Estínfalo – pássaros do pântano (estagnação) que obscurecem o sol. Desejos perversos estagnados no subconsciente que obscurecem o espírito.
Javali de Erimanto – símbolo claro da devassidão desenfreada (porco selvagem). Se ele ainda não domina suas pulsões ao menos tenta dominá-las (matou o javali nos campos nevados que “limitam” seus movimentos).
Corça Cerinita – corça com pés de bronze (como a corça – assim como o cordeiro – simboliza a qualidade da alma oposta a agressividade dominadora), o bronze dos pés – aqui sublimado – é a força do espírito. Exercício da paciência para capturar a corça sem feri-la. Paciência para atingir a sutileza e sensibilidade sublimes.
Estrebarias de Augias – símbolo do subconsciente, lodo indica deformação banal. Usa o rio (símbolo de purificação) e libera os bois luzentes (sublimação) – purificar a lama (subconsciente) da estagnação banal pela atividade vivificante e sensata para alcançar a vida sublime.
Touro de Creta – como o leão, simboliza a banalização titânica. Ao direcionar o touro para o chão imobiliza o desejo jogando-o contra si mesmo.
Cavalos de Diomedes – cujos cavalos devoravam homens – a impetuosidade – tentações – como a banalização que devora a alma. As tentações devem ser “afogadas”.
Cinturão de Hipólita – amazonas simbolizam as “matadoras de homens”, rivalizam com eles ao invés de completarem-se. O herói débil pela perversão dionisíaca, afasta um tipo sedutor de mulher que busca destruir o aspecto espiritual. Vencer a rebelião da mulher (desejo – terra- Gaia) contra o homem (espírito – céu – Zeus). Capturar o cinto – submeter a matéria ao espírito.
Bois de Gérion – gigante de três corpos (perversidades): vaidade banal, devassidão e dominação. Reforça-se com os gozos terrestres (tocar a terra). Héracles esmaga-o em seus braços, levantando-o do chão – sublimação.
Pomos de Hespérides – maça, símbolo da terra, dos desejos terrestres, que o ouro sublima. Sublimação dos desejos – recuperar a união do céu e da terra (Héracles vai até o fim do mundo para alcançar isto).
Cérbero – subconsciente, lugar em que habitam os desejos perversos, é guardado pelo monstro das três pulsões perversas: vaidade, devassidão e dominação. Héracles vence a morte.
As proezas de Héracles, ilustrações do seu impulso espiritual, simbolizam sua luta incansável contra as perversidades das pulsões corporais, tirania e devassidão.
Já adulto, após cumprimento de vários trabalhos purificadores e vestindo a pele de leão (insígnia de sua combatividade vitoriosa), Héracles sucumbe novamente à tentação que o conduz a banalização do ridículo: torna-se escravo de Ônfale, a mulher banal ascende sobre o espírito de Hércules, aviltando-o de forma degradante.
O herói sofre o domínio de outras mulheres até o episódio final: seu amor por Dejanira. Prova determinante de sua força combativa ser ou não capaz superar a maldição de Hera.
Héracles disputa Dejanira com o rio Aquelôo (rio – vida fluente, símbolo da vida passada de Héracles). A vitória traz um mau augúrio, pois o rio é batido apenas em sua forma de serpente e touro (vaidade e tendência de dominação contra as quais o herói já está mais que armado para triunfar).
Héracles é obrigado a atravessar um rio com Dejanira (alcançar a outra margem do rio-obstáculo significa mudança de posição diante da vida – transformação da atitude perversa para a atitude sublime). Dejanira não tem condições de atravessar o rio com suas próprias forças e é carregada pelo centauro Nessus (banalidade – desejos materiais). É mulher banal. A eleição definitiva de Héracles é falsa. Nessus tenta violar Dejanira (persistente perigo da banalização) e é derrotado pelas flechas (arma da sublimidade) de Héracles que havia travessado o rio (realização sublime). Mas esta vitória é tardia, pois ele houvera confiado no monstro ao invés de combatê-lo: o perigo não está eliminado. De fato, Dejanira cai no ardil de Nessus e aceita a túnica envenenada (não confia na força de sua sublimidade, desconfia da fidelidade de Héracles, e é enganada pela promessa banal).
Não há união de almas e Héracles enamora-se de outra mulher (Iole). Dejanira envia-lhe a túnica que queima a carne de Héracles, ou seja, queimam os desejos carnais inflamados, convertidos em paixão (exaltação imaginativa) – o veneno da devassidão. O embate de Héracles com a túnica representa o excesso de desordem que dominou seu conflito interior entre o impulso do espírito (dom de Zeus) e a insaciabilidade do vício (a desgraça de Hera). A alma do herói se desola com decadência de sua “carne”. Ergue-se diante dele “o espelho da verdade”. Com remorso consciente de sua imperfeição sublima sua atração dionisíaca – a devassidão simbolizada pela túnica é tão somente um tormento: Héracles não mais recua diante do fogo da purificação e decide realizar o sublime sacrifício de si (a liberação da alma pelo sacrifício do corpo). O sacrifício na fogueira substitui o fogo da paixão que devora a alma pelo fogo purificador – substitui a “morte da alma” pela “imortalidade da alma”.
No Olimpo, Héracles faz sua eleição definitiva casando-se com Hebe (divindade que serve o néctar e ambrosia aos deuses – símbolo das qualidades espirituais e sublimes), filha de Hera (reconciliação completa).
Héracles é o maior herói mitológico grego, o símbolo da vitória (e da dificuldade da vitória) da alma humana sobre as fraquezas. Os mitos eram instrumentos de ensino. Os meninos queriam ser como Héracles, ser um herói, e o maior heroísmo é controlar suas paixões.
Notas
O mito de Héracles é descrito na Biblioteca de Apolodoro de Atenas (Pseudo-Apolodoro, já que há quase certeza de que o verdadeiro autor é desconhecido).
O nome de Héracles (Hércules latinizado) era Alcides (do avô Alceu – remete à força em grego), a Pítia mandou-o mudar o para Héracles (original grego – glória de Heras) e realizar os trabalhos para glorificar a deusa.
Deusa do amor sublime, Hera tem o traço negativo do ciúme. Como punição Zeus suspende Hera por uma corrente de ouro (símbolo da sublimidade) entre o Céu e a Terra. O amor afetivo fica entre o sublime e o terrestre (material). Apenas purificando-se do ciúme o amor encontra a forma plenamente sublime.
Conhecimento não é educação – a criança grega primeiro tinha uma formação ética, a dignidade do ser. Educação era teatral, dadas sob o plátano.
Filho de Anfitrião e Alcmenes (pai de fato Zeus). Nasceu para ser o rei dos homens, mas o ciúme de Hera impediu isto (Euristeu).
Héracles tem força mas não tem sabedoria e temperança. Após matar seus filhos passará por um processo de iniciação.
Atenas, deusa da sabedoria, ajuda Héracles em muito dos seus trabalhos.
Amazonas significa “sem seio” – decepavam o seio direito para manejar melhor a espada.
Em uma versão do mito o próprio Zeus acende a fogueira da imolação de Héracles com um raio (raio purificador ao invés de punitivo), noutra é o arqueiro Filoctetes quem o faz.